Em visita ao Brasil, Antonio Negri e Michael Hardt discutem o capitalismo na era da informação em Fórum sobre direito autoral realizado no Rio de Janeiro.
Adriano Belisário
O pessimismo diante da crise financeira não cruzou as portas do Pálacio Universitário da Universidade Federal do Rio de Janeiro durante o Fórum Livre de Direito Autoral. O encontro, que terminou no dia 17 de dezembro, reuniu diversos pesquisadores e intelectuais para debater os novos rumos da propriedade intelectual. Com o tema ‘O Domínio do Comum’, o Fórum teve como destaque a palestra dos filósofos políticos Antonio Negri e Michael Hardt.
O nascimento do direito autoral está intimamente ligado à reprodutibilidade das obras. Até o surgimento da imprensa no século XV, simplesmente não havia a necessidade de um instrumento jurídico para regular cópias. Hoje, ao contrário, as infinitas possibilidades de multiplicação na internet colocam o tema na ordem do dia. Para alguns, a abundância de informação e trocas virtuais alterarão não só as leis do direito autoral, como toda organização social.
“A crise explode no interior de um novo conceito do capitalismo. O capital tornou-se cognitivo”, disparou Negri no dia 15 durante a abertura do evento. Segundo o pensador italiano, a força motriz desta nova organização seria a informação e o trabalho imaterial. Marxista, o filósofo aproveitou ainda para alfinetar o teórico neoliberal Fukuyama: – A história não acabou nem mesmo para o capital. Ele não é uma máquina indestrutível e forte. Não é o Leviatã, nunca foi. É uma relação de forças. A revolução não terminou.
O livro ‘Império’, de Negri e Hardt, ganhou projeção internacional por discutir a nova ordem do capitalismo global e suas relações internas de dominação. Em ‘Multidão’, obra mais recente da dupla, o conceito que dá nome à obra é enfatizado como o grande agente revolucionário do mundo.
Segundo Hardt, após o reconhecimento das identidades, há uma fase de afirmação e outra de superação da mesma. No caso da luta contra a discriminação racial, por exemplo, em um primeiro momento, é necessário tornar visível as raças para explicitar hierarquias. A segunda tarefa seria a luta pela afirmação dos então subordinados, com políticas de inclusão social, por exemplo. Por fim, a luta se daria pela abolição da identidade e eis então a multidão.
“A revolução pode partir de projetos de identidade e terminar com a dissolução delas. Isto seria necessário para um projeto revolucionário das multidões”, disse o filósofo norte-americano em sua palestra.
Apesar de também apostar na multidão como o grande agente capaz de realizar a “construção do comum através das singularidades”, Negri destacou os percalços deste caminho. Fundamental no capitalismo, a relação valor-trabalho foi alterada profundamente com o surgimento da chamada era informacional, pois a cooperação não é mais “feita pelo patrão. Mesmo uma parte do capital fixo fugiu da mão do capitalismo. Ela está nos cérebros”. Como a sociedade irá adequar-se a esta nova realidade e reconstruir uma unidade de medida do trabalho é, para Negri, uma questão de pesquisa e experimentação.
Novos comunistas
O economista Yann Moulier-Boutang vê o Google como principal expoente desta nova dinâmica de trabalho. “No Google, você trabalha para você, mas também para eles. São diversos acessos que revelam conexões, criam imensas redes e perfis que são vendidos a empresas interessadas. O golpe de gênio deste capitalismo informacional é de captação das atividades da multidão, é tanto mais lucrativo, pois as pessoas trabalham gratuitamente”, disse.
Segundo Boutang, também a luta pelo interesse comum se dá nestes novos sistemas de informação. Assim, ao lado do capitalismo informacional, surge também o novo comunismo. “Não é necessário restaurar direitos de propriedades. Os novos comunistas não serão derrotados pelo desenvolvimento do capitalismo cognitivo e o setor privado irá se resolver bem”, provocou o pensador francês.
Disponível em: <http://www.revistadehistoria.com.br/v2/home/?go=detalhe&id=2155>. Acesso em: 25 dez. 2008.