A artista Sissel Tolaas tem um laboratório com 7 mil odores e um incômodo: por que os cheiros não têm nomes próprios?
“Cheiro de lixo”, “cheiro de rosas”, “cheiro de madeira”. Ao contrário das cores, que têm nome próprio (azul, verde, rosa), os cheiros não têm palavras específicas para si. Isso sempre incomodou a artista norueguesa Sissel Tolaas, que resolveu batizar os odores: “Giish” virou cheiro de dinheiro e “Pikon”, de cocô de cachorro. O conjunto de palavras forma o Nasalo, língua que auxilia Sissel na difícil missão de mostrar que cheiros são importantíssimos.
A artista tem um laboratório em Berlim com 7 mil odores. Ela prega que o nosso olfato é subestimado, e que deveria interferir no modo como percebemos o mundo. Entre seus projetos, dois se destacam: no primeiro, ela pintou paredes com o “cheiro do medo”, feito de moléculas coletadas do corpo de 20 pessoas com fobias. No outro, ela fez queijo de bactérias dos pés e axilas.
Sissel veio ao Brasil em dezembro de 2015 para o evento What Design Can Do. A conferência, criada cinco anos antes em Amsterdã, reúne grandes nomes do design e da indústria criativa. A proposta é além da estética: mostrar as mudanças que o design pode proporcionar à sociedade. Confira a entrevista que a artista concedeu à SUPER.
Por que acreditamos que o olfato não é tão importante quanto outros sentidos?
Porque você não consegue enxergar o cheiro. A nossa sociedade é dominada pelo visual, e não somos estimulados a usar o nariz para fazer outra coisa que não seja respirar. Mas, quando cheiramos, imediatamente ativamos o nosso inconsciente.
Sempre escutamos que humanos não têm um olfato muito desenvolvido. Isso é verdade?
Não, as pessoas possuem um olfato incrível, elas só não aprendem a utilizá-lo. Sentimos cheiros o tempo todo. Quando você está dormindo, por exemplo, e sua casa pega fogo, você não acorda porque está sentindo calor ou porque vê o que está acontecendo, mas sim porque sente o cheiro de queimado. Eu digo que o nosso corpo é o hardware e os sentidos são os softwares – e eles precisam ser desenvolvidos.
Você tem algum cheiro preferido?
Eu gosto de todos. Como esse é o meu trabalho, tive que treinar o olfato para não categorizar os cheiros como agradáveis ou desagradáveis. Senão, não conseguiria trabalhar direito.
Como foi fazer queijo com bactérias das axilas e dos pés? Funcionou?
Sim! As pessoas sempre sentem nojo de si mesmas por causa dos odores naturais de seus corpos. Então eu decidi fazer queijo com bactérias provenientes das axilas e dos pés, lugares comumentes associados a cheiros ruins. Não existe aquela história que os astronautas reciclam a própria urina para beber? Então por que eu não posso comer queijo do meu próprio corpo? E ficou uma delícia!
Você diz que “nada fede, apenas pensar que algo fede faz com que isso aconteça”. Qual cheiro sofre mais preconceito?
Com certeza, os corporais. Todo mundo se cobre de perfumes e desodorantes para mascarar como cheira de verdade. Tudo é considerado fedido. Na realidade, cada um possui o seu cheiro único, tão único quanto a impressão digital. Por causa desse preconceito nós nunca nos lembramos disso.
Você costuma dar nome a cheiros específicos, como Chiish, cheiro de lojas chinesas, e Suiis, fábrica de caramelos. Como você desenvolve os nomes?
É um procedimento científico, com uma linguagem própria. Eu crio nomes específicos para os cheiros, como o Hiin, que descrevo como mágico. Ele é de uma selva que fica no sul da Ásia.